Sweet Depression

É doce, é uma pressão constante... O blog de uma artista cronicamente deprimida... ou simplesmente deprimente. The blog of a depressive and depressing artist.

10/13/2004

Aspirin(a)

Lu está: ...

Eu estava há uns 3 minutos debaixo daquela estátua que ameaçava cair, 3 minutos que pareciam intermináveis, porque estava sol e estava muito calor e eu estava ansiosa porque era estranho ir ver-te.
Tu vestias um fato de linho claro, tinhas um colar meio amaricado que compraras na "Mauritanea", como insistes em escrever *Isn't it so damn chic like that?* E tinhas pêlos a espreitar à beira do pescoço, no sítio que tinhas libertado do sufoco de uma gravata e nas mãos tinhas uns dedos longos e uma mala e eu pensava "tens umas mãos bonitas, mas eu não te contratava com esse colar abichanado e esse ar de malandro".
E eu comecei a sentir-me mal, porque não bastava o facto de ter ar de miúda e usar uma mini-saia de ganga e umas sabrinas, tinhas tu também um ar muito mais velho do que eu e uns olhos encovados que me intimidavam um pouquinho, mas ainda assim fixei os meus neles, coisa que tu não soubeste fazer e eu mais uma vez perguntei-me porque é que quase ninguém me olha nos olhos se eu até os tenho bonitos.
E depois eu fui comer um gelado de chocolate e sentámo-nos na esplanada onde falámos de trivialidades e da tua entrevista de emprego e eu continuava a pensar se quem te ia contratar teria visto aquele colar tão pouco viril.
E às tantas eu já tinha molho de chocolate no queixo, porque como gelado como os putos com quem trabalho e achei um piadão a isso - e ainda bem que tinha, porque a caminho dos lavabos encontrei os meus primos a quem te apresentei e depois pensei "ufa, agora já não tenho de inventar assunto". E depois achei engraçado como rapidamente trocámos de posições e tu ficaste muito mais acanhado e eu tentava ser simpática, pondo-te a mão sobre o joelho e perguntando se estavas bem.
E depois fomos para o pé do rio, onde falámos longamente e a tarde passou a correr porque eu estava a gostar daquele azul que se estendia do céu até à nossa beira e daquele cheiro e daquele marulhar e tu continuavas a não olhar-me nos olhos, talvez por receio, talvez por encontrares mais interesse nas minhas pernas descobertas e eu resolvi fechar os meus, porque o marulhar sabe melhor assim.
Depois, ensinaste-me a diferença entre o sotaque da tua terra e o de L. e o de B., que para mim soam todos ao mesmo e disseste o quão bom era o teu clube e enquanto eu terminava o meu chá verde e te acenava um adeus no meio da chusma, tu resolveste olhar-me nos olhos, só que com um olhar triste. Ou cansado. Ou enjoado. E eu fiquei a pensar porque é que tinhas ficado assim de repente.

Depois eu estava com uma dor de cabeça, só que a minha mãe e a minha prima arrastaram-me para o shopping e eu pensei que te podia convidar para um chá, para compensar as vezes em que não quis sair contigo. E tu foste ter à livraria e eu larguei a minha mãe e fiquei montes de tempo à tua procura e quando, sobre o meu ombro, me perguntaste se estava perdida, reparei como uns jeans e um capacete na mão te fazem bem mais novo.
E depois fomos ao café e demorou um bocadinho até que tu largasses o folheto e parasses de gozar comigo e começássemos mesmo a falar.
Entretanto eu queimei o meu polegar na chávena de chá e apeteceu-me ser criança e pedir "dá beijinho no meu do-dói", mas depois ias dizer que eu estava muito mais simpática do que o habitual e começar a fazer perguntas sobre isso. Além disso, já é suficientemente pueril regressar aos tempos da primária, em que os meus colegas escreviam textos adoravelmente básicos como este, cheio de "e depois". E tu fizeste-me falar sobre o que é ultrapassar uma depressão e eu saí-me com esta de que ela não se cura como uma gripe e quando senti os olhos a ficarem húmidos, percebi que já estava a falar disso há demasiado tempo e só tinham passado 30 segundos. E aquele ar condicionado começava a ser fresco demais, eu tinha os ombros nus e não usava soutien e pensei "deixem-me sair daqui antes que pensem que estou com tesão".
E depois andámos às voltas, sem rumo, e rimos de coisas como sapatos estúpidos ou do facto de aqui se exporem manequins pretos na montra...
E eu ria-me de coisas sem graça para ser simpática e calava-me quando elas tinham graça, para não parecer demasiado simpática. E só passado um bocado é que percebi como isso era tolo.
E eu ficava atrapalhada de cada vez que exclamavas um "Olá" a um funcionário qualquer e te olhavam de lado, porque era um "olá" impregnado de "Tudo bem? Que bom ver-te!" sem os conheceres de lado nenhum.
E quando me despedi, apeteceu-me afagar-te a face, mas depois pensei "Não, porque ainda não te posso chamar amigo. Desculpa-me por ser tão complicada". Mas no fundo eu estava grata.
Porque aguentaste as minhas neuras, que não foram muitas, mas aguentaste-as e no dia seguinte eras capaz de aparecer na net e dizer coisas como "Então, miúda?" ou "Não me lembro do que disseste" quando eu tentava esboçar um pedido de desculpas.
Porque acho que é nisso que se vê a bondade de uma pessoa; não tanto na sua capacidade de dar o seu sorriso, mas na de dar o TEU sorriso.
E talvez seja por isso que estou a escrever isto às 4 da manhã num papel de rascunho, ou talvez porque sonhei com isto e ainda fiquei 35 minutos a pensar acordada.
E estas coisas surgem encavalitadas, às cambalhotas e eu nem consigo ouvir o meu pensamento, mal consigo seguir o seu ritmo porque nasci para pensar demais e isto faz-me doer a cabeça, tal como doía hoje à tarde quando me obrigaram a ir às compras e eu lembrei-me de te convidar para um café.

No fundo, já sei o que fazer quando tiver uma dor de cabeça.


Lu is: ...

I had been under that statue, which looked like it was about to fall down, for 3 minutes that seemed infinite, because it was sunny and it was hot and I was anxious because it was strange to meet you.
You wore a light linen suit, a faggish necklace you had bought in “Mauritanea”, as you insist on writing *Isn't it so damn chic like that?* And you had hair coming up to your neck, on the place you had relieved from the suffocation of a tie and on your hands you had long fingers and a suitcase and I thought “you have nice hands, but I wouldn’t hire you with that gay necklace and that rascal look”.
And I started feeling uncomfortable, because, not only I looked like a kid and wore a denim mini-skirt and “Audrey” casual shoes, but you also looked a lot older and you had deep sunk eyes that intimidated me a little, yet I stared at them, unlike you and once again I asked myself why in the world nobody looks into my eyes if they are pretty.
And then I went to eat a chocolate ice cream and we sat on the esplanade where we talked about trivialities and your job interview and I kept wondering if the person who was going to hire you had seen that not-so-manly necklace.
And then I had chocolate syrup on my jaw bone, because I eat ice cream just like the kids I work with and I found that so funny – and it was a happy coincidence, because, when heading to the ladies room, I found my cousins and introduced you to them and thought “phew, now I don’t have to make up a lame conversation anymore” and it was funny how we instantly switched positions and you got much shier and I tried to be nice by putting my hand on your knee and asking if you were ok.
And then we sat by the river, where we talked for a long time and the afternoon ran so fast, because I was enjoying that blue that spread from the sky to us and that smell and that gaze and you still didn’t look into my eyes, maybe because you were afraid, maybe because you were more interested in my uncovered legs and I decided to close my eyes, because the gaze feels better like that.
And then you taught me the difference between the accent from your city and the accent from L. and from B. that sounded the same to me and you said how great your team was and whilst I finished my green tea and waved you goodbye from the middle of the crowd, you finally looked into my eyes, but with a sad look. Or maybe it was tired. Or sick. And I wondered why you were looking at me like that, all in a sudden.

And then I had a headache, but my mother and my cousin dragged me to the mall and I thought I’d invite you for a cup of tea to make it up for the times I hadn’t wanted to go out with you. And you were in the book store and I left my mum and it took me a while to find you there and when you asked me if I was lost, over my shoulder, I noticed how you look so much younger wearing jeans, with a moto helmet on your hand.
And we sat on the cafe and it took a while till you dropped the brochure and stopped mocking me and we started actually talking.
Meanwhile, I burned my thumb on the teacup and I felt like being a child and begging you “smooch my sore”, but then you would say I was way more sweet than the usual and start asking questions about it. Besides, it is childish enough to get back to elementary school times, when my classmates wrote adorably shallow essays like this one, full of “and thens”. And you made me talk about what it is like to overcome a depression and I came out with this one that one can’t heal it like a flu and when I felt the moist in my eyes I realized I had been talking about it for way too much time and it had only been 30 seconds. And that conditioned air already felt too cold, my shoulders were uncovered and I was wearing no bra and I thought “let me get out of here before I look like I’m getting horny…”.
And then we walked around aimlessly and we laughed at things such as stupid shoes or the fact that people exhibit black mannequins in shop windows.
And I laughed at things that weren’t funny to look kind and remained silent when they were funny so that I wouldn’t look too kind. And only a while after I realized how dumb that was. And I got embarrassed every time you exclaimed a “Hi” to some random sales assistant and they’d see you like an alien because it was a “Hi” full of “How’s it going? Good to see you!” and you didn’t even know them.
And when I said goodbye, I felt like caressing your face but then I thought, “No, it’s still early to call you a friend. Forgive me for being so complicated”. However, all in all, I felt grateful.
Because you put up with my neurotic behaviour, which is not that frequent, but you do and on the next day you can show up on IM and say stuff like “What’s up?” or “I don’t remember the things you said” when I try to make apologies.
Because I think that’s where you see someone’s benevolence; not on their ability of giving their smile, but on the ability of giving YOUR smile.
Perhaps that’s why I’m writing this at 4:00 a.m. on a draft paper, or maybe because I dreamed about this and spent 35 minutes thinking about it, awake. And these things come up mashed, tumbling down and I can’t even hear my thoughts, I can hardly follow their pace because I was born to think too much and this makes my head hurt, just like this afternoon, when they’ve made me go shopping and I decided to ask you for a cup of tea.

In the end, I already know what to do when I have a headache.